Não existe uma fórmula única para a democracia. O modelo desenhado por Aristóteles, na Grécia antiga, não contemplava eleições, representantes, parlamento, nem nada disso. Abrangia única e tão somente a possibilidade de os cidadãos (dentre os quais não estavam inclusos os trabalhadores braçais, estrangeiros e mulheres) se reunirem na "ágora", para deliberar sobre assuntos de interesse coletivo.
Séculos mais tarde, dois intelectuais franceses se notabilizaram por desenhar diferentes formas de democracia que, de uma forma ou de outra, se contrapõem e se complementam entre si. Rousseau e Montesquieu conceberam de maneira detalhada o que hoje conhecemos como democracia participativa (direta) e representativa (indireta).
Rousseau defendia a democracia direta, participativa. A participação popular só é válida quando feita diretamente. Acreditava que eleger representantes equivaleria a alienar o poder de decisão. Rousseau, também, desacreditava a tripartição de poderes. Afirmava que o poder é uno e indivisível, advém do povo e deve ser exclusivamente por ele exercido.
Montesquieu concebeu diferente. A democracia, segundo ele, passa necessariamente pela eleição de representantes. Estes usariam de suas virtudes morais e intelectuais para deliberar em nome do povo, podendo, inclusive, decidir contra interesses imediatos de seus eleitores, caso entendam que o bem geral dependa disso.
Pois a Constituição Brasileira contemplou as duas formas de democracia, mas deu inegável ênfase à tese de Montesquieu. Tal preferência pela representação não é de todo irracional. O Brasil é enorme e quanto maior e mais complexa uma organização política mais difícil é a implementação de uma democracia direta.
O problema é que, para nós, democracia é quase que sinônimo exclusivo de representação. São pouquíssimas e muitas vezes desacreditadas as iniciativas de participação direta da população nos assuntos de governo. Mesmo questões de âmbito local, como o funcionamento de um posto de saúde ou a pintura de uma escola pública, costumam ser deliberadas sem qualquer participação da sociedade civil.
Ao colocar todos nossos ovos na cesta da democracia representativa, ficamos totalmente dependentes de nossos representantes. Demo-lhes poderes para decidir tudo que nos diz respeito, porém, o abismo entre o que eles decidem e o que efetivamente nos importa é cada vez maior. Ademais, não creiam que eles nos devolverão esse poder espontaneamente.
A solução para o problema não está em "votar com consciência", ou "escolher bem os representantes". Dizer isso significa repetir clichês vazios que só reforçam a ideia de que o povo não decide nada. É aceitar a ingênua premissa de que a responsabilidade não está em nós, mas em terceiros, os políticos, estes sim, os malvados culpados por nossa situação.
A solução está numa mudança de cultura, de paradigma democrático, algo impossível de se propor num texto de 2.900 caracteres.